Professores-Usuários: Desafios da interatividade

O fato de que as redes sociais fizeram emergir novas formas de pensar não é surpresa. Seja no âmbito pessoal ou profissional, a disseminação e o uso de informações e conhecimentos têm atingido níveis que eram inimagináveis anos atrás. Os conceitos relacionados a cibercultura e cultura de convergência nunca foram tão palpáveis como nos dias de hoje, no sentido de explorar mídias, tornando a comunicação muito mais flexível.

As redes sociais já atingiram um nível de interação muito amplo, fazendo surgir novas situações de comunicação, de recebimento e de transmissão de informações. A aplicabilidade desse recurso no âmbito da educação parece oscilar entre a necessidade de integrar de forma criativa essas redes ao ensino e a possibilidade da iminente desestruturação da educação tradicional. No entanto, esse dilema não altera em nada o fato de que alunos e professores têm usado as redes sociais sem critérios muito definidos. Diversas pesquisas apontam os brasileiros como aqueles que mais utilizam as redes sociais diariamente. Podemos ir além de simplesmente falar dos benefícios e malefícios, e entender de forma mais completa as implicações desse uso.

A presença do professor nas redes sociais é um exemplo de interação que tanto pode funcionar para o ensino como prejudicar todo o esforço alcançado nas relações com os alunos em sala de aula. Fala-se muito sobre as desvantagens e os pontos negativos da exposição nas redes sociais, mas a maioria dos argumentos são baseados em mitos, situações contornáveis ou aspectos que, na prática, não apresentam problemas. Em contrapartida, nem tudo o que se imagina ser positivo é realmente benéfico, por se tratar de algo utópico, que não abrange a realidade, ou por se tratar mesmo de algo bastante nocivo.

A informação verdadeira – Quando pensamos em aspectos como a veracidade das informações, temos sempre a tendência de desconsiderar as postagens das redes sociais, mas, se examinarmos um pouco mais, veremos que muitas informações publicadas diariamente no ciberespaço são surpreendentemente verídicas e não nos damos conta disso. A falta de seriedade e idoneidade com que grande parte dos usuários atua tem-nos impedido de identificar o que é válido na rede. Na maioria das vezes, isso se torna possível por meio do contato com comentários postados por outros usuários. Apesar de existirem comentários pouco embasados, conseguimos perceber a importância de um feedback negativo ou positivo, pois respostas quase imediatas às nossas postagens nos leva a analisar melhor a informação.

Com o desenvolvimento da tecnologia, surgiu a possibilidade de estarmos conectados à internet em todos os lugares. No entanto, com o mercado de trabalho tão competitivo e exigente, as pessoas têm desenvolvido uma competência tal que lhes permite dar conta de dois ou mais núcleos de atividades ao mesmo tempo.

Apesar de soar como algo comum hoje, tal situação não acontecia em décadas passadas, uma vez que jovens e adultos foram desenvolvendo essa característica com a chegada da era digital à medida que foi sendo necessário. Isso tem aprimorado o raciocínio e aguçado a concentração, permitindo que as pessoas tirem proveito do tempo e ampliando as áreas de atuação.

Outro aspecto relevante em relação a esse assunto é a facilidade de acesso aos mais variados ambientes virtuais que existem hoje. Ainda que pareça um tipo de tribuna livre, podemos ver jovens que se expressam livremente, pessoas que expõem o que pensam sobre uma diversidade de assuntos e as que aparecem para criar soluções alternativas para diferentes situações. Muitos perdem o medo de um novo aprendizado ou de fazer questionamentos quando são criados fóruns, testes e pesquisas, aproveitando a oportunidade sem temer o pré-julgamento ou a exposição.

Muitas vezes, temos dado tanta ênfase no combate a esses veículos de informação que nos esquecemos de que eles podem romper barreiras na sala de aula, que é a miniatura da sociedade. Convém lembrar que as redes sociais têm concebido muitos formadores de opinião, que expressam suas ideias e conclamam internautas à responsabilidade social por meio de comunidades virtuais. De acordo com André Lemos, em seu artigo “Cibercultura como território recombinante”*, “o território digital cria uma zona dentro de outros territórios onde é possível acessar, produzir e distribuir informação, de maneira autônoma”. Professores têm aderido a essa ideia e isso se tornou popular nas escolas.

Logo, não são apenas os grandes veículos de comunicação que transmitem informações e conhecimentos relevantes para a sociedade, mas o perfil, o canal ou a comunidade também, e não se restringem unicamente a um grupo de amigos, mas se estendem a um grupo bem maior de indivíduos.

“Copiar e colar” – O que vemos hoje no ciberespaço é uma desconstrução do conceito de comunicação. É “imaturidade digital”, por assim dizer, fazer uso de ferramentas que
não conhecemos completamente. A informação de fácil acesso, que sem dúvida é um dos pontos altos da rede mundial, parece ser uma amostra dos problemas de superficialidade detectada nos usuários das diversas redes sociais.

Com os mecanismos de busca avançada, trabalhos acadêmicos e livros técnicos disponíveis on-line, bem como milhares de dicionários, enciclopédias e manuais para consulta, as antigas pesquisas escolares que levavam horas ou dias em salas de bibliotecas são reduzidas a uma mera reunião de materiais e a uma seleção desses conteúdos. A facilidade operaria sem qualquer falha se todo o conteúdo disponível fosse verdadeiro, acurado e com sólido embasamento. Isso, infelizmente, não é uma realidade.

Acostumamo-nos à comodidade da pesquisa on-line, mas esquecemo-nos de avaliar o produto de nossa busca e como isso vai afetar aqueles com quem vamos compartilhar esse conteúdo. Inúmeros casos desse tipo ocorrem diariamente nas redes sociais e os que se contentam com uma pesquisa rasa sobre as informações compram as ideias e as opiniões tomando-as como verdades absolutas. Até mesmo o plágio é favorecido com os sistemas digitais simplesmente pelo fato de que não se escreve mais. A cultura do “copiar e colar” tem ignorado os direitos autorais e as referências. Tantos são mediadores ou “compartilhadores” de conteúdos dos quais nem sequer conhecem a origem. A antiga forma de pesquisa que recorria aos livros empoeirados das bibliotecas priorizava o que a pesquisa digital se esqueceu de filtrar: a veracidade. Os alunos que se enredarem nesse emaranhado de informações superficiais precisaram contar com professores cientes de que poderão orientá-los a fazer uso dos veículos de informação com mais eficiência.

Por entendermos que, como professores continuamos sendo referência para os alunos, mesmo que em um ambiente virtual, devemos ter mais cuidado com o que postamos, curtimos ou compartilhamos. Além de nos expormos, como qualquer outra pessoa, nossa vida profissional também é exposta, permitindo que os alunos interpretem de forma equivocada nossos posicionamentos e opiniões. Sendo professores ou gestores, temos grande responsabilidade em relação a tudo aquilo que postamos. Acima de tudo, devemos ter a consciência de que somos referência para inúmeros alunos que passam pelas salas de aula ano após ano.

Por mais estranho que pareça, a interatividade pode ser encarada, também, como uma vilã da era digital. Mais uma vez, a facilidade acaba complicando as coisas. Hoje há alunos extremamente exigentes. O professor não pode mais ser alguém alienado do mundo virtual e nem deve ser uma pessoa superficial. A ênfase não está mais no conhecimento em si, mas no uso prático dele. O ato de aprender envolve o conhecimento das ferramentas que são usadas para obter o que será aprendido. Paradoxalmente, a autoimagem do professor depende de sua competência em aprender a usar os recursos que estão disponíveis a ele, e isso exigirá que vá além das aparências. Ou seja, redobrar a atenção a cada palavra, texto ou imagem postada não parece uma má ideia se o professor levar em consideração o que pode estar sendo colocado em xeque: o conhecimento.


* LEMOS, André. Cibercultura como território recombinante. In: TRIVINHO, E.; CAZELOTO E. (Orgs.). A cibercultura e seu espelho: campo de conhecimento emergente e nova vivência humana na era da imersão interativa, São Paulo, 2009. Disponível em: <http://goo.gl/lkFVQZ>. Acesso em: 3 mar. 2015.
Fonte: Revista CPB Educacional – 1º semestre de 2015

Autoria: Lídia Uarte

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